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Personalidades Potiguares

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Mução, o personagem, fruto da mente criativa e engenhosa de Rodrigo Vieira Emerenciano, conseguiu, através de três CDs de pegadinhas, não apenas divertir, mas também criar uma conexão profunda com seu público. Suas pegadinhas, permeadas por bordões como “Respeita a polícia!”, “Pense numa popa/numa pegada de ar!”, “Aí é bruto que só os pés da burra!”, “Esse cabra é grosso que nem cano de passar tolete” e “Parabéns, pegou ar!” transformaram-se em marcas registradas, ecoando pelas rádios e lares brasileiros.

Segundo o próprio Rodrigo, seu personagem tem origem em Cachoeira do Sapo, uma localidade situada no interior do Rio Grande do Norte. Estima-se que Mução tenha mais de 60 anos, simbolizando perfeitamente o estereótipo do matuto nordestino, com um pronunciado sotaque regional e um léxico recheado de expressões típicas da região.

O gênio por trás do personagem

Rodrigo Vieira Emerenciano, nascido em Natal no dia 8 de outubro de 1976, é um nome de peso no cenário do rádio e do humor no Brasil. Filho da ex-secretária da Receita Federal Lina Vieira, Rodrigo cultivou desde cedo a discrição sobre sua vida pessoal, focando a atenção do público em seu trabalho e em seu icônico personagem. Sua trajetória educacional, iniciada no Colégio Santo Antonio Marista (hoje Colégio Marista de Natal), pavimentou o caminho para o sucesso que viria.

A carreira de Rodrigo, e consequentemente de Mução, decolou no final dos anos 1990, quando o programa “A Hora do Mução” começou a ser transmitido via satélite para diversas emissoras de rádio pelo país, conquistando uma audiência fiel com seu humor inigualável. A versatilidade de Mução também o levou a participar de coberturas de eventos internacionais de grande porte, como a Copa do Mundo de Futebol de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, ampliando ainda mais seu reconhecimento. A mudança estratégica para o Rio de Janeiro no início de 2013 visava a consolidar a presença de Mução nas regiões sul e sudeste do país, além de aproveitar os grandes eventos esportivos que a cidade sediaria. Esse movimento se mostrou acertado, reafirmando a capacidade de Rodrigo de se reinventar e manter seu personagem relevante no cenário nacional.

O ano de 2020 marcou um novo capítulo na história de Mução, com a participação de Rodrigo no programa The Noite, apresentado por Danilo Gentili no SBT. Pela primeira vez, após 24 anos de carreira, o público teve a oportunidade de associar o rosto de Rodrigo ao seu famoso personagem, num momento histórico para os fãs e para a mídia nacional.

Mução, com sua “Fuleirosofia”, não é apenas um personagem; é um legado, uma ponte entre as raízes culturais do nordeste brasileiro e o humor que une o país. Rodrigo Emerenciano, através de sua criação, mostrou como a arte do humor pode transcender barreiras geográficas e sociais, trazendo alegria e identificação para pessoas de todos os cantos do Brasil.

A chegada de Pedro Álvares Cabral às terras brasileiras marcou o encontro dos europeus com os povos nativos que já habitavam a região. De começo, os índios foram escravizados. O reconhecimento de que eram brasileiros com direito à terra veio de forma lenta, graças à atuação de personagens como Filipe Camarão, que ainda no período colonial, lutou bravamente ao lado de negros e brancos em defesa do Brasil. Nascido por volta de 1600 na região que hoje corresponde ao Rio Grande do Norte, ainda menino, ele foi convertido ao cristianismo e batizado pelos jesuítas como Antônio Filipe Camarão.

Assumiu alguns dos costumes dos brancos, aprendeu a ler e escrever em português, latim e até em holandês. Trajava se à moda dos portugueses e quando estava com os indígenas trajava se à moda dos indígenas. Filipe Camarão era uma forma de intermediário cultural.

Por sua liderança entre as tribos, assumiu posição de comando na expulsão dos invasores que ocuparam o nordeste durante o século XVII. A chegada dos estrangeiros relacionava-se diretamente com a disputa pelo açúcar e tinha ligação também com a crise da sucessão em Portugal. A partir de acordos com os holandeses, Portugal obtinha empréstimos de capital, oferecendo em troca os direitos de refino do açúcar e distribuição no mercado europeu. Mas quando em 1580, o trono português passou para a Coroa espanhola, a situação mudou. Por serem rivais dos espanhóis, os holandeses perderam o comércio de açúcar e foram proibidos de aportar em terras portuguesas. Diante dos prejuízos, elaboraram um plano para atacar as colônias no além mar.

O primeiro ataque ao Brasil aconteceu em 1624, na Bahia. Os invasores conseguiram ocupar Salvador, mas ficaram cercados dentro da cidade e foram expulsos pouco tempo depois. Em 1630, aconteceu a segunda investida: os holandeses chegaram ao litoral pernambucano com uma esquadra de 56 navios. Sem recursos para a resistência, Matias de Albuquerque retirou a população da cidade e incendiou os armazéns do Porto, evitando que o açúcar ali guardado caísse nas mãos do inimigo. A resistência pernambucana não durou muito. Com o tempo, os senhores de engenho decidiram aceitar a influência estrangeira, já que os invasores traziam dinheiro para investir no Brasil. Graças ao apoio de Domingos Fernandes Calabar e a habilidade militar holandesa, em 1634 a Companhia das Índias Ocidentais superou as forças luso brasileiras e instalou certa estabilidade na região. Era a conquista da capitania mais rica da colônia portuguesa.

A serviço da Companhia das Índias Ocidentais. O conde alemão João Maurício de Nassau chegou à cidade do Recife em 1637. Trouxe consigo um grande contingente militar e tentou novamente ocupar Salvador, mas não superou as forças luso brasileiras. Na batalha baiana, outra vez, Filipe Camarão liderou tropas contra os holandeses. Nassau decidiu então adotar outras estratégias. A primeira medida foi restabelecer a produção de açúcar em Pernambuco a partir da concessão de empréstimos. Além de obter lucros, ele queria também formar uma colônia holandesa no Brasil. Apesar das guerrilhas, expandiu o domínio da Companhia das Índias em todo o litoral nordestino, do Maranhão até a foz do Rio São Francisco.

Parte do lucro holandês com o açúcar estava reservado a Nassau. Daí sua disposição em estimular o crescimento da área conquistada. Realizou diversas obras de urbanização no Recife: construiu vilas, palácios e pontes. Para conquistar simpatia, garantiu a liberdade política e de culto. Com isso, permitiu a vinda dos primeiros judeus ao Brasil. Em Pernambuco, eles ergueram a primeira sinagoga das Américas. As potencialidades da terra conquistada foram estudadas por uma comitiva trazida por Nassau. Albert Eckhout, Frans Post e Gaspar Barleus preocupavam-se em registrar detalhadamente os aspectos naturais do Brasil holandês. Estes registros assumiram um caráter científico e ficaram conhecidos em toda a Europa.

No interior do Nordeste, Filipe e sua mulher, Clara Camarão seguiam empenhados em catequizar índios que haviam abraçado o calvinismo introduzido pelos holandeses. Ele agia como porta voz das tribos na luta para eliminar a escravidão a que estavam submetidos.

“Era o momento no qual os indígenas estavam tentando entender aquela ordem colonial, entender aqueles que chegavam na sua terra e tentar negociar com eles. Essa é a posição do Filipe Camarão. Ele está dentro da ordem e ao mesmo tempo está fora. E está tentando entender como os portugueses se comportavam para operar com aquela gramática política e permitir que o seu povo, ao conhecê-la, tivesse um elemento de negociação. A gente pode considerar esse papel do Filipe Camarão um papel de negociação, de busca, de espaço para garantir e proteger aqueles que eram iguais a ele, da sua própria etnia ou população e, com isso, garantir, evidentemente, espaços maiores de proteção e vigilância com relação à escravidão que era praticada, então, contra os indígenas”, segundo explica o historiador Marcos Magalhães.

Após a revolução nacionalista, o trono português foi restaurado na figura do rei João IV. O novo monarca resolveu encerrar o embargo contra os Países Baixos. Na mesma época, a Companhia das Índias Ocidentais decidiu iniciar a cobrança dos empréstimos feitos às elites pernambucanas. Por discordar da decisão, Nassau voltou à Europa. Era o momento esperado pelos senhores de engenho que, mesmo sem apoio formal da coroa portuguesa, começaram a se organizar para expulsar os invasores. O movimento eclodiu em 1645 e ficou conhecido como a Insurreição Pernambucana. Com a volta dos combates, Camarão foi novamente chamado a lutar. Tomou parte das forças brasileiras na Batalha das Tabocas, ao lado de Vidal de Negreiros e Henrique Dias. Em 1648, assumiu a liderança da ala direita do Exército dos Independentes, comandando a tropa de índios na primeira Batalha dos Guararapes. Os holandeses não resistiram após a vitória brasileira, foi agraciado com o título de Dom e a Comenda da Ordem de Cristo. Ferido em combate, faleceu pouco depois. As lutas prosseguiram e o exemplo de Filipe Camarão foi seguido por vários outros índios e os holandeses foram expulsos meses depois.

Apesar de sua jornada ser questionada pela ausência de documentos históricos que autentiquem suas conquistas, estudiosos salientam que tal vazio pode estar ligado à invisibilidade feminina e à desvalorização de figuras indígenas na história. No vilarejo de Tejucupapo, em Pernambuco, anualmente, um coletivo de mulheres reencena a batalha que definiu a rota de Clara Camarão, homenageando a resistência feminina contra os invasores e contra a discriminação.

Clara Camarão nasceu no século XVII, no território que hoje é conhecido como Rio Grande do Norte, embora tenha residido na capitania de Pernambuco. Adotou o nome “Clara” após ser batizada na fé cristã, enquanto seu nome indígena original permanece desconhecido nos registros históricos. O apelido “Camarão” originou-se de seu casamento com o indígena Poti (palavra tupi para “camarão”), também chamado Antônio Felipe Camarão, que, assim como ela, foi catequizado por jesuítas.

Conforme os registros, Clara esteve ao lado do marido em confrontos contra os invasores holandeses. Sua primeira missão oficial, no entanto, foi à frente de uma tropa feminina, responsável por escoltar famílias em busca de refúgio na cidade de Porto Calvo, em Alagoas, nos anos 1630.

Na data estimada de 23 de abril de 1646, durante o episódio conhecido como Batalha de Tejucupapo, Clara demonstrou notável desempenho. Com a informação de que as tropas sob a liderança de Felipe Camarão haviam sido chamadas para proteger Salvador, os holandeses tentaram uma invasão em Tejucupapo, região litorânea de Pernambuco. Entretanto, foram inesperadamente confrontados pela tropa feminina.

Essas mulheres prepararam barris de água fervente com pimenta. O vapor pungente, levado pelo vento, atingiu o exército holandês, deixando os soldados com os olhos em chamas, desorientados pela pimenta. Foi nesse momento que elas partiram para o ataque. As potiguaras surpreenderam os invasores com sua precisão e força, manejando arcos, tacapes e lanças, conquistando a vitória.

O valente desempenho dessas mulheres, posteriormente denominadas “Heroínas de Tejucupapo”, rendeu-lhes um chamado para integrar um dos mais significativos confrontos contra os holandeses, a primeira Batalha de Guararapes (1648). Após sucessivas derrotas, os holandeses finalmente se renderam em 1654, no Recife.

Homenagens a Clara Camarão

Pela sua destacada atuação, Clara foi agraciada com as honras do título de “Dona”, tradicionalmente concedido a integrantes da alta aristocracia e notáveis líderes militares. Conforme o Dicionário das Mulheres do Brasil, ela também foi honrada com a comenda de hábito de Cristo, um privilégio geralmente reservado aos homens.

No vilarejo de Tejucupapo, situado no município de Goiana, em Pernambuco, no último domingo de abril, um conjunto de mulheres dramatiza a batalha transcorrida na localidade, prestando homenagem às combatentes que se opuseram aos invasores holandeses. Estas representações, iniciadas em 1993, são organizadas pela Associação Grupo Cultural Heroínas de Tejucupapo.

Em 2017, o nome de Clara Camarão foi solenemente incorporado ao Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, localizado no Panteão da Pátria, na Praça dos Três Poderes, em Brasília. A líder indígena também é celebrada na Refinaria Potiguar Clara Camarão (2009), situada em Guamaré (RN), a primeira refinaria brasileira a ser batizada com o nome de uma mulher.

Clara Camarão permanece como um símbolo vibrante de resistência e coragem, uma fonte de inspiração para todas as pessoas que lutam por justiça e liberdade. Sua história, muitas vezes negligenciada nos registros históricos dominados pelos feitos masculinos, é um lembrete poderoso da força, habilidade e resiliência das mulheres na formação da nação brasileira.

Nascida em 1918 em Natal, Lucy Garcia Maia pertencia a uma renomada família local. Educada na Escola Doméstica, destinada a moldar damas da sociedade na gestão do lar, Lucy optou por seguir seu profundo amor pelos esportes. Ela se destacou no tênis, vôlei, basquete e até se aventurou no remo, tradicionalmente um esporte masculino. Lucy foi instrumental na criação do Centro Desportivo Feminino, incentivando outras mulheres de Natal a abraçarem o esporte.

Sua ousadia não parou por aí. Em 1942, Lucy Garcia Maia quebrou barreiras, enfrentou tabus e discriminações e, em 1942, conseguiu o feito de se tornar a primeira mulher norte-rio-grandense brevetada no Aero Clube. A aviação, assim como o remo, era considerada uma área dominada por homens. No entanto, com a bênção e apoio de seu pai, Lucy perseguiu seu sonho de voar.

“Precisei de coragem para enfrentar a sociedade, porque uma moça sozinha no meio de 12 rapazes causava estranheza”, comentou. Começando sua formação em julho de 1942, ela estava frequentemente rodeada por colegas e instrutores masculinos. Após treze horas de treinamento, tomou as rédeas de um Piper Cub J-3.

No seu voo inaugural, ela deslumbrou-se ao sobrevoar os encantos de sua cidade natal. Apesar de desafiar as expectativas, o que a movia era mais a paixão do que a rebelião. Em um testemunho de 2000, Lucy refletiu sobre sua experiência, declarando à pesquisadora Ana Amélia Fernandes: “Sentia-me como se fosse dona do mundo, dominando o espaço e confiante na arte de voar. Medo? Nunca senti isso em relação à aviação. Meu verdadeiro desejo era seguir na carreira e me tornar piloto comercial.” Decolou da Base Aérea de Natal, atravessou a cidade no sentido norte, cruzou o rio Potengi, fez voos rasantes sobre a praia da Redinha, as dunas e o azul-turquesa das lagoas. Na volta à base, os colegas e seu instrutor a esperavam muito apreensivos.

Em 25 outubro de 1942, Lucy foi oficialmente licenciada, autorizada a pilotar modelos como Piper J-3, Culver e PT-19. Por meia década, Lucy voou, realizando viagens para destinos como Fortaleza, Recife e João Pessoa. Sua coragem ecoava os feitos da norte-americana Amélia Earhart, que uma década antes, em 1932, tornou-se a primeira mulher a cruzar o Atlântico sozinha em um avião, imitando a façanha anteriormente conquistada por Charles Lindbergh em 1927.

Alguns anos depois, em 1947, ela casou-se com Evaldo Lira Maia, um piloto da Aeronáutica que também era da Varig, com quem teve quatro filhos. E foi justamente a maternidade que fez Lucy reconsiderar sua carreira nas companhias aéreas. “Eu olhava aquela criancinha no berço e ficava imaginando se alguma coisa me acontecesse durante um voo; ela ficaria sem os meus cuidados maternos”, refletiu. Lucy morreu em outubro de 2001 em sua residência, no bairro de Morro Branco, sucumbindo a um câncer, sendo enterrada no cemitério do Alecrim aos 83 anos.

Lucy Garcia Maia não foi apenas uma pioneira na aviação potiguar; ela também inspirou outras mulheres a seguirem seus sonhos, independentemente dos obstáculos. Seu legado vai além dos voos que realizou e das distâncias que percorreu. Ela provou que o céu, literalmente, não é o limite para quem tem paixão e determinação. Apesar dos desafios enfrentados em uma época onde o papel da mulher era extremamente restrito, Lucy abriu caminho para outras aviadoras e desafiou as convenções sociais. Hoje, ao olharmos para o céu de Natal, é essencial lembrarmo-nos de Lucy Garcia Maia, não apenas como a primeira aviadora potiguar, mas também como símbolo de perseverança, coragem e paixão.

Filho do italiano Vincenzo De Cicco e da potiguar Ana Albuquerque, Januário Cicco nasceu no dia 30 de abril de 1881 em São José de Mipibu, no Rio Grande do Norte e foi um importante nome da medicina potiguar do início do século XX. Formou-se em medicina na Universidade Federal da Bahia e mudou-se para Natal em 1906 e desde então desempenhou um papel crucial na saúde pública e privada da cidade e do estado do Rio Grande do Norte.

Até sua chegada, a cidade contava apenas com o Hospital da Salgadeira, inaugurado em 1855. Era nesse estabelecimento que a população buscava assistência médica. No entanto, no mesmo ano em que Januário chegou a Natal, o hospital teve de encerrar suas atividades devido à falta de infraestrutura adequada para atendimento ao público. Diante deste cenário, Januário Cicco reconheceu a urgência de oferecer cuidados médicos à população local de maneira mais digna e segura. Sem expectativa de apoio político ou financeiro externo, decidiu abrir um consultório em sua própria residência, dando início aos atendimentos à comunidade.

Em 1909, Januário Cicco inaugurou o Hospital de Caridade Juvino Barreto, considerado o primeiro hospital popular da cidade. O imóvel escolhido pertencia ao governador Alberto Maranhão, que gentilmente disponibilizou sua residência de veraneio para a causa. A localização da casa era estratégica, estando próxima à costa. A crença popular da época defendia que os ventos marinhos beneficiavam os tratamentos médicos. O hospital, fundado por Januário Cicco, passou a ser conhecido como Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL) em 1960, nome que ainda mantém. Onofre Lopes, que deu nome ao hospital, foi o fundador da UFRN. Porém, a trajetória de Januário Cicco em Natal não se restringiu apenas a essa conquista. Ele se destacou como uma figura central na medicina popular da cidade.

Em 1927, surgiu a Sociedade de Assistência Hospitalar (SAH) com o objetivo de administrar o Hospital Universitário Onofre Lopes. Anteriormente sob controle governamental, o hospital tornou-se inteiramente civil, o que otimizou processos e reduziu burocracias. No mesmo ano, Januário Cicco iniciou uma campanha para estabelecer uma maternidade, recebendo, para isso, a doação de um terreno pelo então prefeito, Omar O’Grady.

O nascimento da Maternidade-escola Januário Cicco

Com o terreno garantido, a busca era agora por recursos para a edificação. A arrecadação estava a todo vapor com eventos, festas e leilões. Contudo, em 1937, uma tragédia pessoal abateu Januário: a perda de sua filha e esposa. Essa dolorosa experiência fez com que ele mergulhasse de cabeça no trabalho, deixando de lado qualquer envolvimento social. Em 1942, com o desenrolar da Segunda Guerra Mundial, Natal se tornou um ponto estratégico, atraindo muitos americanos à região. Eles necessitavam de uma instituição hospitalar, especialmente uma maternidade, que estava em seus estágios iniciais de desenvolvimento.

Esse cenário propiciou um impulso significativo ao projeto, e em 1950, a Maternidade de Natal foi, finalmente, aberta ao público. Às 9h do dia 15 de fevereiro daquele ano, a primeira criança veio ao mundo: uma menina batizada de Yvette, em tributo à filha que Januário Cicco perdera anos antes. O próprio Januário Cicco deixou bem claro uma coisa: “Não construí a maternidade para abrigar soldados e sim para mulheres pobres darem à luz em paz.”

A Maternidade de Natal inaugurou com 64 quartos e um número duas vezes maior de leitos, onde cada quarto tinha o nome de uma flor. Mas foi em 1961 que a maternidade foi renomeada como Maternidade-Escola Januário Cicco, servindo como campo de aprendizado para os estudantes da então recém-criada UFRN, nas áreas de obstetrícia e ginecologia. Atualmente, a maternidade destaca-se como um pilar de saúde em Natal, consolidando-se entre as melhores em atendimentos e consultas via SUS. Outro mérito da instituição é a Certificação da Qualidade de Banco de Leite Humano, concedida ao Banco de Leite Humano da Maternidade. Este reconhecimento já foi entregue seis vezes consecutivas pela Associação Brasileira de Profissionais de Bancos de Leite Humano e Aleitamento Materno (ABPBLH-AM).

Além da pioneira instituição de saúde e da maternidade, Januário Cicco também foi responsável por criar o primeiro serviço de pronto socorro de Natal; foi idealizador do primeiro banco de sangue de Natal; criador da Escola de Auxiliares de Enfermagem e foi fundador do Centro de Estudos da Sociedade de Assistência Hospitalar. Além destes incríveis feitos, Januário Cicco escreveu várias obras, entre as mais importantes estão: “O Destino dos Cadáveres” (1906); “Como se Higienizaria Natal” (1920); “Memórias de um Médico de Província” (1928); “Eutanásia” (1932). É importante ressaltar que essas obras são de extrema importância no meio médico até os dias atuais.

O legado de Januário Cicco não se restringe às paredes da maternidade que leva seu nome. Sua visão e dedicação à saúde influenciou gerações e estabeleceu padrões para a medicina no estado. A cidade de Natal deve muito a este pioneiro, que com sua paixão e compromisso, elevou os padrões de cuidado e formação médica na região. Assim, ao caminhar pelas ruas de Natal e ao ouvir o nome “Maternidade Januário Cicco”, é impossível não reconhecer a imensa contribuição deste médico potiguar para a saúde e formação médica do Rio Grande do Norte. Ele é, sem dúvida, uma das grandes personalidades da história potiguar.

Dom Nivaldo Monte, natural de Natal e nascido em 15 de março de 1918, era filho de Pedro Alexandre do Monte e Belarmina Sobral do Monte. Originários de uma família humilde e trabalhadora de agricultores do sertão pernambucano, carregavam uma profunda religiosidade. Tiveram oito filhos, mas apenas sete sobreviveram e a fé, união e preparação para a vida, eram valores centrais na criação de seus filhos. Deste núcleo familiar emergiram profissionais dedicados, como um médico, um dentista, um farmacêutico e três sacerdotes. Entre esses sacerdotes estavam o Cônego Luiz Gonzaga do Monte, que, embora tenha falecido em 1944, foi amplamente reverenciado como “sábio e santo” em sua época, e o Padre Orígenes Monte, um exemplar pai e sacerdote que foi ordenado já na fase adulta e após ser viúvo.

Apesar de sua estrutura física delicada e saúde vulnerável, Dom Nivaldo possuía um espírito inabalável e determinado. Ele nunca se submeteu aos desafios da vida, expandindo constantemente seus horizontes e, conforme suas próprias palavras, buscava “pisar firme, pensar alto e ver longe”. Iniciou sua formação secundária no Seminário Menor de Natal em 1931, com apenas 13 anos. Prosseguiu seus estudos em Filosofia e Teologia no Seminário Maior de Fortaleza entre 1934 e 1938. Além disso, participou de diversos cursos de atualização para sacerdotes e bispos, assim como cursos especializados e de extensão universitária.

Dotado de uma mente aguçada, sua lógica de pensamento revelava uma constante busca pela verdade. Estava sempre mergulhando mais profundamente no mistério dos seres e acontecimentos, em sua incessante procura por novas maneiras de compreender e existir.

O Ministério Eclesiástico de Dom Nivaldo Monte

Dom Nivaldo Monte iniciou sua trajetória eclesiástica com sua ordenação diaconal em 15 de agosto de 1940, seguida pela ordenação sacerdotal em 12 de janeiro de 1941. Este rito aconteceu na Catedral de Nossa Senhora da Apresentação em Natal, sob a benção de Dom Marcolino Esmeraldo de Sousa Dantas. Apesar de sua jovem idade, recebeu uma dispensa especial da Santa Sé para ser ordenado. Iniciou sua missão sacerdotal em São Gonçalo do Amarante em 1941 e, posteriormente, serviu nas Paróquias de Goianinha e Arez entre 1942 e 1943. A paixão por sua vocação e o zelo pastoral foram marcas registradas de seu serviço.

Mudando-se para a capital da Diocese, teve a honra de ser o primeiro Capelão militar durante a guerra, atuando como intermediário entre as guarnições brasileira e americana no posto de capitão. Junto ao renomado Padre Eugênio de Araújo Sales e outros sacerdotes, ajudou a fundar o Movimento de Natal, uma iniciativa pioneira de relevância regional e nacional.

Foi nomeado Bispo em 1963, escolhendo como lema “Mihi vivere is Christus” (Para mim o viver é Cristo). Em 1965, tornou-se Administrador Apostólico da Arquidiocese de Natal e, dois anos depois, foi nomeado Arcebispo Metropolitano, posição que manteve até sua renúncia em 1988. Seu pastoreio em Natal destacou-se pelo empenho no campo pastoral e ação social, alinhado a um comprometimento ímpar com a Igreja e sua missão. Promoveu a educação dos leigos, incentivou a formação de seminaristas e valorizou o laicato. Seu papel foi fundamental na criação de instituições como o Instituto de Teologia Pastoral – ITEPAN. em 1955.

Sua habilidade administrativa garantiu a gestão adequada dos recursos da Arquidiocese, apoiando a expansão do trabalho pastoral e social. Em sua visão de governança, buscou equilíbrio e colaboração com os poderes públicos e privados, sempre visando o bem comum.

Como bispo, Dom Nivaldo fundou o Serviço de Assistência Urbana (SAUR); construiu a Granja do Clero, em Emaús, e criou oito paróquias. Escreveu numerosos livros, entre eles “Formação do Caráter”, A Dor” e “O Coração é para Amar”. Dom Nivaldo Monte faleceu no dia 10 de novembro de 2006 e foi sepultado em Emaús, nos Jardins do Monteiro de Sant`Ana.

Se o destino é moldado pelas ações que tomamos ao longo do caminho, a jovem Victoria Barros, de meros 13 anos, está dando os passos certos rumo ao seu grande sonho: tornar-se uma tenista profissional e elevar o nome do Brasil nas competições mais prestigiadas do planeta.

Nascida na cidade do Natal, no Rio Grande do Norte, essa promissora potiguar já alçou voos além das fronteiras nacionais e, atualmente, aprimora suas habilidades na França, sob a orientação de Patrick Mouratoglou, treinador de renome que já colaborou com lendas do tênis, como Serena Williams. E parece que Victoria já está causando impacto: conquistou três títulos em suas primeiras três competições na Europa. Victoria conquistou o título nas três competições consecutivas em que competiu no Chipre, sendo duas em Limassol e uma em Larnaca. Aos 13 anos, superou adversárias que chegavam até os 18 anos e possuíam rankings notáveis. Apesar de sua idade, já está posicionada entre as 650 primeiras na categoria juvenil com uma extrema maturidade.

“Desde que cheguei aqui, notei uma grande evolução. Minha mãe sempre me diz: O que você pratica no treino, reproduz em jogo. Então, se sua preparação não é boa, é inútil. Se treinar diariamente, com intensidade e disciplina, naturalmente estará pronta para ótimos jogos e torneios. Reconheço a importância do ranking, mas idade ou posição não definem tudo. Eu não tinha um ranking estabelecido, mas fui lá e dei o meu melhor, assim como qualquer outra pessoa pode fazer. Seu desempenho vale muito mais do que sua reputação. Consegui ganhar os primeiros três torneios ITF, fiz uma pontuação muito boa, ganhando os três. Antes já havia a possibilidade de entrar na fundação do Patrick, e quando eu ganhei o primeiro torneio ITF eles já anunciaram oficialmente. Agora estou aqui na fundação dele.”

Com um golpe poderoso e uma inteligência aguçada nas quadras, Victoria Barros destaca sua constante concentração nos treinos, buscando aprimorar seu jogo tanto técnica quanto mentalmente. A jovem tenista de 13 anos admira Serena Williams e Roger Federer, mas também se inspira em nomes emergentes do tênis e na brasileira Beatriz Haddad Maia, que recentemente ascendeu ao top 10 de simples da WTA.

“As minhas inspirações no tênis sempre foram o Roger Federer e a Serena Williams. Infelizmente agora já deu o tempo deles, nada é para sempre né?! Então agora sou muito fã da Bia, muito fã. A Sabalenka também gosto bastante. No masculino eu gosto bastante do Alcaraz e do Holger Rune. Queria parabenizar e muito a Bia. O que ela está fazendo pelo tênis feminino brasileiro é incrível. Eu conheci pessoalmente, é uma pessoa muito trabalhadora. Tudo que ela está fazendo agora não foi fácil, exigiu muito trabalho para conseguir. Nosso tênis está evoluindo cada vez mais, o feminino principalmente, nunca foi tão famoso. A Bia agora top 10 do mundo, a Luisa e a Pigossi com a primeira medalha na Olimpíada, então o tênis está dando mais um passo agora no Brasil.”

Victoria Barros teve início no Beach Tennis

Embora seu amor seja pelo tênis, foi através do Beach Tennis, esporte com muitas semelhanças, que sua paixão se acendeu. Sempre acompanhada de sua mãe, sua principal aliada nesse início de jornada rumo ao topo, Victoria viajou pelo Brasil até cruzar caminhos com Patrick Mouratoglou, que se encantou por seu talento nas quadras. Ao relembrar sua trajetória até a França, ela valoriza cada memória e, acima de tudo, cada lição aprendida.

“Tudo começou com a minha mãe, ela sempre foi do esporte, sempre jogou vôlei, beach tennis, e eu sempre tive muito contato com ela. Foi do beach tennis que eu me interesse mais pelo tênis, fui lá na quadra conhecer e gostei do esporte, comecei a jogar. Em 2018 eu saí de Natal e fui para São Paulo, para o Instituto Tênis e lá eu fiquei oito meses, e foram oito meses muito bons, de aprendizado. Sempre com a minha mãe. Depois recebi uma proposta de Curitiba para ir ao Instituto Ícaro, e lá foram dois anos e meio, consegui evoluir, ter contato com pessoas muito boas. Depois voltei para São Paulo, para a Rede Tênis Brasil e lá fiquei cerca de um ano e meio, dois anos, e comecei a jogar torneios internacionais, a me destacar nesses torneios, ganhei meu primeiro de nível internacional – com destaque para um de atletas de 14 anos disputado nas quadras de Roland Garros -, e aí o Patrick (Mouratoglou) foi ao Brasil (em visita ao Brasil em 2021), mas no primeiro dia a gente não teve muito contato. No segundo ele me mandou uma mensagem perguntando se eu queria ir treinar com ele por uma hora e meia, e eu não ia falar não (risos). Era uma oportunidade muito grande, fui lá treinar com ele e foi assim que tudo começou. Depois de alguns torneios a gente decidiu vir pra França, foi uma decisão muito difícil, mas valeu muito a pena. Estou conseguindo evoluir bastante. Chegamos na França em janeiro, já estou no quinto mês aqui, trabalhando bastante, já consegui ganhar bons torneios. É tudo muito novo para mim, mas já estou me acostumando. Evoluindo bastante, aproveitando o momento.”

Mesmo com sua tenra idade, Victoria demonstra uma maturidade impressionante ao abordar um tema lamentavelmente persistente no mundo dos esportes: a luta contra o racismo. Negra, oriunda do nordeste e atuando em um esporte frequentemente visto como de acesso restrito, mesmo com vários projetos sociais em vigor, a jovem potiguar de 13 anos expressou suas opiniões sobre a questão e fez questão de destacar a postura de Vinicius Jr. diante das situações vivenciadas durante a temporada na Espanha.

A ascensão de Victoria Barros no mundo do tênis não é apenas uma conquista pessoal, mas também um triunfo para o esporte brasileiro. Em um país onde o tênis muitas vezes fica à sombra do futebol, a trajetória de Victoria prova que o Brasil tem potencial para brilhar em diversas modalidades esportivas. Para os fãs potiguares e brasileiros, o futuro parece brilhante, e o nome “Victoria Barros” é, sem dúvida, um nome a ser lembrado nas próximas temporadas. A estrela potiguar está apenas começando sua jornada, e o mundo do tênis está ansiosamente aguardando seu próximo movimento.

João Fernandes Campos Café Filho, nascido em Natal no dia 3 de fevereiro de 1899, foi um renomado advogado e político brasileiro. Ele se destacou como o 18º presidente do Brasil, ocupando o cargo de 24 de agosto de 1954 até 8 de novembro de 1955. Antes disso, entre 1951 e 1954, exerceu a função de 13º vice-presidente brasileiro e, simultaneamente, presidiu o Senado Federal. Café Filho tem a distinção de ser o único natalense e o primeiro protestante a assumir a presidência brasileira. Junto com Ernesto Geisel, são os únicos presidentes protestantes do país. Além disso, ele foi o primeiro presidente nascido após a Proclamação da República.

Nascido no Rio Grande do Norte, Café Filho começou sua carreira como jornalista na juventude. Entre os anos de 1918 e 1919, destacou-se como o primeiro goleiro do Alecrim Futebol Clube. Ele detém a notável distinção de ser o único presidente brasileiro que atuou como jogador de futebol em competições adultas. Na esfera política, Café Filho esteve ativamente envolvido na campanha da Aliança Liberal em 1930. Em 1933, fundou o Partido Social Nacionalista (PSN) no Rio Grande do Norte. Anos depois, associou-se à criação do Partido Social Progressista, ligado a Ademar Pereira de Barros. Foi eleito deputado federal em 1934 e 1945.

No entanto, seu ativismo político não foi sem desafios. Em face de suas constantes denúncias na Câmara sobre a possibilidade de um golpe, Café Filho enfrentou represálias. Em 14 de outubro de 1937, sua casa foi alvo de uma invasão policial e seu cunhado, Raimundo Fernandes, foi detido. Para evitar sua própria prisão, Café Filho se manteve em ocultação até 16 de outubro. Com a ajuda do deputado José Matoso de Sampaio Correia, conseguiu asilo político na embaixada da Argentina e, posteriormente, exilou-se no país vizinho de novembro de 1937 a maio de 1938.

Café Filho nas eleições de 1950

No pleito de 1950, Ademar de Barros, governador de São Paulo e líder do Partido Social Progressista (PSP), condicionou seu apoio à candidatura presidencial de Getúlio Vargas à indicação de Café Filho para a vice-presidência. Essa imposição encontrou resistência em Getúlio, uma vez que Café Filho era visto com desconfiança por militares e pela igreja católica, por ser percebido como um político de inclinações esquerdistas. Em sua trajetória, Café Filho se opôs à aplicação da Lei de Segurança Nacional em 1935 e, em outubro de 1937, posicionou-se contra o estado de guerra proposto com base no Plano Cohen, um documento falso usado para justificar a instauração da ditadura do Estado Novo. No parlamento, advogou contra a anulação do registro do PCB e a cassação dos mandatos dos parlamentares comunistas. Era também um fervoroso defensor da legalização do divórcio.

Incomodado com a hesitação de Getúlio, Ademar foi incisivo em sua mensagem à mídia: “A eleição de Vargas depende do PSP”, declarou. E, de forma determinada, acrescentou: “A candidatura do Café Filho a vice-presidente será mantida, independentemente dos obstáculos”. Diante dessa pressão, o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) só oficializou a candidatura de Café Filho junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na data limite para o registro eleitoral. Mesmo formando a mesma chapa, a desconfiança entre Getúlio e Café Filho permaneceu evidente.

Em 1950, as votações para presidente e vice-presidente eram separadas. Ainda assim, Café Filho sagrou-se vitorioso na corrida pela vice-presidência, superando o segundo colocado, Odilon Duarte Braga da União Democrática Nacional (UDN), por uma margem de 200 mil votos. Adicionalmente, Café Filho foi reeleito como deputado federal pelo Rio Grande do Norte (conforme permitido pela legislação eleitoral da época). Ele se destacou ao receber mais de 19 mil votos, superando renomados políticos do estado, como Aluízio Alves, Djalma Marinho, Valfredo Gurgel, Jerônimo Dix-huit Rosado e José Augusto Bezerra de Medeiros.

Café Filho como vice-presidente do Brasil

Durante seu mandato como vice-presidente do Brasil, Café Filho também desempenhou o papel de presidente do Senado Federal de 1951 a 1954. Em reconhecimento ao seu serviço e mérito, foi homenageado com a Grã-Cruz da Ordem Militar da Torre e Espada, uma honraria portuguesa, em 20 de setembro de 1951.

No cenário de instabilidade que se seguiu ao atentado da rua Tonelero, o Brasil enfrentou uma intensa crise política. Em meio a essa turbulência, Café Filho propôs a Getúlio Vargas que ambos entregassem seus cargos ao mesmo tempo, possibilitando a formação de um governo interino de coalizão. Vargas, ponderando a proposta, buscou o conselho de amigos, inclusive o ministro da justiça, Tancredo Neves. Neves aconselhou Vargas a descartar a sugestão, considerando-a uma estratégia astuta de Café Filho. Após refletir, Getúlio comunicou a Café Filho sua decisão de permanecer no cargo. Em resposta, Café Filho declarou que, uma vez que sua sugestão foi recusada, ele não se sentia mais compelido a manter sua lealdade inabalável a Getúlio e ressaltou: “Se por algum motivo o senhor deixar este palácio, é meu dever constitucional assumi-lo”.

Café Filho foi presidente do Brasil

Após o trágico suicídio de Vargas em 24 de agosto de 1954, Café Filho assumiu a presidência, mantendo-se no cargo até novembro de 1955. Em abril daquele ano, ele foi honrado com a Grã-Cruz da Banda das Três Ordens. Durante seu mandato, destacou-se pela adoção de políticas econômicas liberais, lideradas pelo economista Eugênio Gudin. Este era um firme defensor de medidas econômicas ortodoxas e propôs a redução de gastos públicos, o limite de crédito, a criação de uma taxa única de eletrificação e a retenção automática do imposto de renda sobre salários, sempre visando combater a inflação.

Contudo, divergências surgiram e, em abril, Gudin renunciou. As razões incluíam descontentamentos locais com as políticas cambiais e demandas políticas do governador de São Paulo, Jânio Quadros. O sucessor de Gudin foi José Maria Whitaker, que enfrentou desafios significativos em sua gestão, resultando em sua renúncia em outubro de 1955. Mário Leopoldo Pereira da Câmara assumiu o posto até janeiro do ano subsequente.

Conforme registros da Presidência, seu governo teve outras realizações notáveis, como a criação da Comissão para determinar o local da nova capital federal, a inauguração da usina hidrelétrica de Paulo Afonso e o estímulo ao investimento estrangeiro, impulsionando o processo de industrialização do país. Visando a coesão e o apoio parlamentar, Café Filho sempre enfatizava o caráter temporário de sua gestão e sua falta de ambições políticas maiores. Seu mandato foi, assim, marcado por uma postura conciliatória, contando com a colaboração de militares, empresários e políticos.

Em novembro de 1955, Café Filho teve que se afastar da presidência por problemas de saúde. Em seu lugar, assumiu Carlos Luz, presidente da Câmara, que foi rapidamente deposto após tentar barrar a posse do presidente eleito, Juscelino Kubitschek.

Após sua passagem pela presidência, Café Filho dedicou-se ao ramo imobiliário no Rio de Janeiro. Em 1961, a convite do governador Carlos Lacerda, aceitou a posição de ministro no Tribunal de Contas da Guanabara, onde atuou até sua aposentadoria em 1969. Café Filho faleceu no Rio de Janeiro em 20 de fevereiro de 1970. Em suas memórias, ele confessou: “Admito que não estava preparado para ser presidente, e acredito que ninguém realmente esteja”. Sua partida foi lamentada por diversas personalidades, incluindo o almirante Augusto Rademaker, vice-presidente do Brasil na época, e Bento Munhoz da Rocha, ex-governador do Paraná, que expressou seu pesar dizendo que sentia a perda “como a de um inestimável aliado”. Café Filho foi enterrado no Cemitério de São João Batista, situado no Rio de Janeiro.

Consegue identificar a bicicleta na imagem acima? Está posicionada logo abaixo do homem de cabelos acaju, o renomado Kid Lima. Detentor de quatro recordes no Guinness Book por manobrar a bicicleta mais minúscula do mundo, este brasileiro é reconhecido como um dos maiores equilibristas em duas rodas globalmente. Contudo, paradoxalmente, foi ofuscado em seu país.

Frank Sinatra já presenciou Ava Gardner, Marilyn Monroe e Lauren Bacall sem vestimentas. Já assistiu a Martin Luther King derramando lágrimas enquanto ele entoava “Ol’ Man River”, um hino contra o racismo. E até já se emocionou com 170 mil brasileiros cantando “My Way” em um Maracanã abarrotado. Contudo, nada se comparava àquilo. Estávamos em 1988, no luxuoso hotel Fointanebleau em Miami. A celebração? Uma campanha de arrecadação para o Haiti, que reuniu as grandes estrelas do entretenimento. E o destaque? Um adulto equilibrando-se em uma bicicleta de míseros 6 cm (sim, menor que uma caixa de cigarros). Era o ápice da performance do artista brasileiro Kid Lima, o mágico do ciclismo.

“Na plateia, Sinatra, Michael Jackson e Julio Iglesias aplaudiam entusiasmados. Após a apresentação, Sinatra se aproximou e compartilhou que jamais tinha presenciado algo tão único quanto o meu ato”, relata Lima, direto de sua residência em Las Vegas. Se até Sinatra, com toda sua experiência na indústria do entretenimento, estava surpreso, era porque realmente aquele feito era inédito. E permanece sendo. Kid Lima conquistou um espaço no Guinness Book, o Livro dos Recordes, em quatro ocasiões, sempre como o ciclista das menores bicicletas do mundo – a mais pequena delas, com apenas 6 cm, foi fruto de sua própria engenhosidade.

Euclides Medeiros de Lima dedicou sua vida a manter o equilíbrio sobre duas rodas. Nascido em Natal, no Rio Grande do Norte, ele é o sexto de nove irmãos e filho de um mecânico. Em sua juventude, era frequentador assíduo das apresentações circenses que visitavam sua cidade, sendo os números de bicicleta os que mais capturavam sua atenção. Armado com as habilidades adquiridas na oficina de seu pai, Euclides recriava proezas complexas – como desmontar sua bicicleta em movimento até que restasse apenas uma roda – ao se apresentar nas ruas de Natal.

Aos 13 anos, o jovem autodidata Euclides exibiu seus talentos acrobáticos ao proprietário do renomado circo Tihany, que prontamente o convidou a integrar a equipe. Sem que sua família soubesse, pegou um ônibus rumo a Fortaleza para reunir-se ao grupo circense. Ao tomar conhecimento da fuga do filho, seu pai acionou o Juizado de Menores e enviou o irmão mais velho de Euclides para buscá-lo. Após seu retorno, enfrentou uma severa reprimenda por parte do pai, que determinou que ele só deixaria o lar aos 18 anos, após concluir, no mínimo, o ensino secundário. Contudo, apenas um ano mais tarde, Euclides conseguiu persuadir sua mãe a fornecer-lhe dinheiro para uma passagem aérea até o Rio de Janeiro, mantendo essa decisão em segredo do pai.

Ao desembarcar na então capital brasileira, trazendo consigo sua fiel bicicleta, Euclides foi ao encontro do renomado palhaço Carequinha, a grande estrela circense daquele 1958. Após demonstrar sua performance, foi imediatamente contratado pelo aclamado artista, que sugeriu uma pequena alteração: “O nome ‘Euclides’ não vai funcionar! A partir de agora, você será conhecido como Kid Lima”. Em pouco tempo, Kid Lima já estava se apresentando no programa televisivo de Carequinha e viajando pelo Brasil sob a asa protetora do circo. “Ele me tratava como se fosse seu próprio filho”, relembra. Durante essa fase, Kid deixou de lado outra de suas paixões: a luta livre.

Após sua experiência com Carequinha, Kid Lima explorou outros palcos renomados, incluindo os circos de Jarbas Olimecha e Franz Tihany. Também marcou presença nos programas televisivos de figuras como Arrelia, Flávio Cavalcanti, Moacyr Franco, Hebe Camargo, entre outros. “Jarbas foi quem me instruiu que não era suficiente apenas apresentar meu ato; eu precisava entender de vestuário, saber como me comunicar com o público e tornar o espetáculo mais envolvente. Ele sugeriu, por exemplo, que eu posicionasse a bicicleta sobre o banquinho de um elefante”, relembra Kid. “Quando Kid chegou ao Rio, já dominava a bicicleta com maestria. No entanto, seu visual ainda era bem simples, usando camisetas de times de futebol”, comenta Luiz Olimecha, sobrinho de Jarbas e fundador da Escola Nacional de Circo.

Pouco tempo após sua chegada ao Rio, Kid já se aventurava em terras estrangeiras, partindo com a bênção de sua mãe para um espetáculo em um cassino de Mar del Plata. Esse foi o ponto de partida para uma extensa e aclamada jornada internacional, englobando quase todos os países da América Latina, Europa e Ásia. Sua carreira incluiu uma residência de 12 anos no Japão e períodos significativos em Las Vegas, com apresentações em renomados cassinos como Caesar Palace, MGM e Tropicana. “Tenho registros de 162 nações em meus passaportes. E domino oito idiomas, incluindo o japonês”, declara Kid com orgulho, um autodidata que cursou apenas até a quinta série. “Me apresentei duas vezes no show do Ed Sullivan, palco onde os Beatles fizeram sua estreia nos EUA. Em Tóquio e Las Vegas, sou frequentemente reconhecido e abordado para autógrafos.”

Durante as décadas de 60 e 70, Kid Lima já havia consolidado sua posição como um dos mais destacados equilibristas em bicicleta do planeta, introduzindo novidades, como uma manobra onde a bicicleta era erguida sobre um pedestal. Porém, foi no início da década de 80 que ele desenvolveu seu ato mais icônico: a pedalada em uma minibicicleta (para ter noção do feito, é recomendável assistir a este vídeo). Inicialmente, a bicicleta media 30 cm, o que já lhe garantiu uma menção no Guinness Book. Com o passar do tempo, a bicicleta foi ficando ainda menor, proporcionalmente ao aumento da popularidade do ato. Kid ainda adicionou um elemento cativante: ele desafiava alguém da plateia a tentar pedalar a minibicicleta, oferecendo um prêmio que podia alcançar US$ 20 mil. “A pessoa geralmente acaba caindo, e a plateia se diverte à beça”, comenta Kid, rindo da própria criação mesmo após três décadas de apresentações.

Sem dúvida, Kid Lima é um nome que ficará para a história, não apenas do ciclismo, mas como um símbolo de determinação e sucesso.

De acordo com reportagem do Diário de Natal, publicado no dia 01 de dezembro de 1976, o trecho diz na primeira página: “Morro do Careca tem dono. Desde 1920 é aforado a D. Amélia”.

A matéria dizia: “As dunas do Morro do Careca não pertencem mais ao Estado. Essa verdade foi constatada ontem pelo Diário de Natal ao confirmar a existência de uma velha carta de aforamento, datada de 1920, onde a Sra. Amélia Machado, a Viúva Machado, é dona de pelo menos 600 hectares, desde o mar até a Barreira do Inferno, nos limites com Pirangi. Na sua casa, a Viúva Machado não pode falar sobre suas terras, mas familiares confirmaram que encontraram a velha carta de aforamento e que a Prefeitura e o Governo do Estado já estão informado. O advogado da família, Sr. César Cabral, vai discutir o assunto com o Governo do Estado, em termos de indenização, já que a própria família defende a preservação da área apoiando o Diário de Natal.”

Confira a reprodução da matéria

O Morro do Careca e parte da Barreira do Inferno são de propriedade da Sra. Amélia Duarte Machado, de acordo com velhos documentos dos idos de 1920, que comprovam o título de posse de uma área de cerca de 600 hectares, no trecho entre a praia de Ponta Negra e o município de Eduardo Gomes (atualmente Parnamirim). Por se encontrar enferma — submeteu-se a uma cirurgia no fêmur e seus 94 anos não permitem maiores esforços, a Sra. Amélia Machado não pôde atender a reportagem do Diário de Natal, no seu casarão estilo neoclássico, ao lado da igreja do Rosário. Alguns parentes, contudo, afirmaram que “as terras são da viúva Machado”.

O problema da posse do Morro do Careca surgiu há alguns meses, mas somente foi denunciado há menos de 60 dias, por uma solicitação do Sr. Daniel Gosson, junto ao Departamento de Divisão de Terras da Secretaria da Agricultura. Pretendia o requerente executar um projeto de “reflorestamento” no local. Com a ameaça de graves prejuízos à ecologia da cidade, o governador Tarcísio Maia declarou que não permitiria mais nenhum tipo de construção ao longo dos Morros de Natal, e que todas as terras seriam consideradas de interesse público. Àquela data, o governador ainda não sabia que as terras pertenciam à Viúva Machado.

Segundo informações de alguns parentes da Viúva Machado, antes de solicitar a carta de aforamento o Sr. Daniel Gosson entrou em contatos com a proprietária das terras, querendo fazer um negócio. Nenhum negócio foi feito nem os documentos mostrados ao interessado, que imediatamente entrou com o requerimento, pois acreditou que as terras pertenciam ao Governo do Estado. Quando todos acreditavam que o problema do Morro do Careca havia sido solucionada, a Sra. Amélia Machado buscou em seus velhos documentos algumas plantas daquela área e constatou que as terras lhes pertencia, como também grande parte da Barreira do Inferno. O advogado Sr. César Cabral está de posse de todos os velhos documentos. Pretende a família acertar tudo com o governador Tarcísio Maia, “sem conflitos de interesse, pois não somos políticos nem estamos com intenção de brigar desnecessariamente”, declarou o Sr. Humberto Micussi, filho adotivo da Viúva Machado, acrescentando que “sabemos da necessidade de preservar aquela área verde. O governador está certo”.

O advogado César Cabral, que se encontra em viagem, logo que retorne encontra em viagem, logo que retorne entrará novamente em contato com o Sr. Luiz Liberato, responsável pelo Departamento da Divisão de Terras da Secretaria de Agricultura do Estado, visando à realização de uma reunião com o governador do Estado, quando então seria definida qual a solução para o impasse.

Informaram ainda os parentes da Viúva Machado que a maioria daquelas terras pertencia à família, mas algumas áreas foram loteadas, há alguns anos. Em nenhum momento, pensou-se em lotear o Morro do Careca para fins imobiliários, nem mesmo com as ofertas feitas pelo Sr. Daniel Gosson. Preferiram esperar mais alguns tempos. Relembra o Sr. Humberto Micussi que há muito anos, “quando o Cardeal Dom Eugênio de Araújo Sales ainda era padre”, uma considerável área foi doada pela família Machado, ao então padre, para ele construir um local para retiros religiosos, que tempo depois também seria transformado em casa de Hóspedes. As terras realmente pertencem à Sra. Amélia Duarte Machado, segundo os velhos documentos. O governador Tarcísio Maia foi taxativo em declarar que toda a área seria considerada de interesse público. A área vive constantemente ameaçada pela invasão de posseiros e a cidade necessita de áreas verdes, para que sua ecologia não seja prejudicada.

Somente com a chegada do advogado da Viúva Machado e do governador Tarcísio Maia, – este último se encontra em Brasília, onde manteve contatos com o presidente Ernesto Geisel – é que será solucionado o caso do Morro do Careca. “Solução?”. Encontraremos nos contatos, que vamos manter com o governador. Só não queremos criar conflitos, concluiu um dos parentes.

Na verdade, a Viúva Machado foi tapeada

Matéria publicada no Diário de Natal afirma que as terras realmente eram do Estado e a Viúva Machado não teria o direito as terras:

Mesmo que a Sra. Amélia Machado tenha documentos que comprovem a posse do Morro do Careca e parte das terras da Barreira do Inferno, a gleba pertence ao Estado, porque nenhum tributo foi pago pela família, desde que conseguiu a carta de aforamento, no início do século. Segundo o secretário da Agricultura, Sr. Moacir Duarte, as terras devolutas mesmo que estejam aforadas só prevalece o direito de aforamento visando a utilização agro-pastoril. “O aforamento configura apenas o domínio útil da gleba e não o domínio pleno”, disse. Hoje as terras do Morro do Careca pertencem, portanto, ao Governo do Rio Grande do Norte. Além disso, tanto que a fiscalização para impedir a subida do morro tem o monitoramento da Polícia Ambiental e o Instituto de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (IDEMA).